
Comprar um imóvel é, para a maioria das pessoas, um dos maiores investimentos da vida. Diante disso, é natural esperar que o bem entregue pela construtora esteja em perfeitas condições de uso, principalmente quando se trata de um apartamento novo. No entanto, o que temos observado nos últimos anos, especialmente em meio ao crescimento acelerado de lançamentos residenciais e à valorização imobiliária, é que muitos imóveis têm sido entregues com falhas sérias de acabamento ou até mesmo com problemas estruturais.
Esses problemas são chamados de vícios construtivos e podem comprometer tanto o conforto quanto a segurança dos moradores. Eles podem ser vícios aparentes, como trincas, infiltrações e portas desalinhadas, ou vícios ocultos, como falhas em instalações hidráulicas e elétricas, vazamentos internos ou estruturas comprometidas que só se revelam com o tempo.
Ao identificar um defeito no imóvel, o primeiro passo é documentar o problema. Fotografias, vídeos e, se possível, um laudo técnico são fundamentais. Em seguida, deve-se notificar formalmente a construtora, solicitando o reparo.
O Código de Defesa do Consumidor (CDC) garante ao comprador o direito de exigir a solução do problema no prazo de até 30 dias. Se o vício não for corrigido nesse período, o consumidor poderá optar entre a devolução do valor pago, devidamente atualizado, o abatimento proporcional no preço ou, conforme o caso, indenização por danos materiais e morais.
O artigo 26 do CDC estabelece que o consumidor tem 90 dias para reclamar de vícios aparentes, contados a partir da entrega do imóvel. No caso de vícios ocultos — ou seja, aqueles que só aparecem com o tempo, esse prazo só começa a contar a partir do momento em que o problema se torna perceptível.
Importante: o prazo para reclamar só começa a correr após a resposta negativa da construtora à solicitação formal feita pelo consumidor. Enquanto isso não ocorrer, o direito do comprador continua preservado. Esse é um ponto frequentemente ignorado por empresas do setor.
Além disso, ações judiciais que visam indenização por danos causados pelos vícios construtivos não se sujeitam ao prazo decadencial de 90 dias. Nesses casos, aplica-se o prazo prescricional de cinco anos, previsto no artigo 27 do CDC, ou até mesmo o prazo geral de dez anos, do Código Civil, dependendo do tipo de dano e da fundamentação jurídica adotada, como reconhecido pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:
“Quando, porém, a pretensão do consumidor é de natureza indenizatória (isto é, de ser ressarcido pelo prejuízo decorrente dos vícios do imóvel) não há incidência de prazo decadencial. A ação, tipicamente condenatória, sujeita-se a prazo de prescrição.” (REsp 1717160/DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 22/03/2018).
Muitas construtoras tentam se esquivar da responsabilidade alegando o fim do período de garantia contratual. No entanto, a jurisprudência tem sido clara ao afirmar que, em se tratando de vício oculto, o prazo legal começa a contar apenas do momento em que o defeito se revela, independentemente do que estiver previsto em cláusulas contratuais ou termos de recebimento da obra.
E mais: mesmo que haja cláusula tentando limitar a responsabilidade da construtora, essa limitação não tem validade quando o defeito compromete a segurança, a habitabilidade ou o valor do imóvel.
Tanto os proprietários quanto os condomínios devem estar atentos aos vícios construtivos. No caso dos proprietários individuais, é essencial conhecer os prazos legais e agir rapidamente ao identificar qualquer problema, protegendo o seu patrimônio e garantindo as condições de habitabilidade do imóvel. Já os condomínios, especialmente em empreendimentos recém-entregues, também desempenham papel fundamental: cabe à gestão condominial zelar pelas condições gerais da edificação, pela segurança estrutural, funcionamento dos equipamentos das áreas comuns, sistemas de segurança e controle de acesso, além de assegurar que a entrega do empreendimento esteja em conformidade com o que foi prometido.
Em ambos os casos, o suporte jurídico adequado é essencial para garantir a responsabilização da construtora e a adoção das medidas corretas, evitando prejuízos financeiros e riscos à segurança dos moradores. Em um mercado cada vez mais aquecido e exigente, a informação e a atuação preventiva são os melhores caminhos para a proteção do seu imóvel.